segunda-feira, 21 de julho de 2014

Voltinha no Parque





Gosto dos rituais: vencer a preguiça, colocar a filhota no carrinho, atravessar a Castanheiras, subir a 26 Norte, entrar pela portinhola, decidir se subo ou se desço (se subo, enfrento o sol no rosto. Se desço, deixo a subida para o final, quando já vou estar cansada), decidir se será volta inteira ou volta interrompida e, finalmente, usufruir a paisagem que, no caso, é tanto natural quanto humana.

Se subo, logo passo pelos pneus com flores. Sempre acho aquilo muito bucólico, mas sou incorrigível e fico também olhando os prédios, avaliando se gosto ou se não gosto da fachada, se o valor é alto ou baixo, se gostaria ou não de morar ali. Nesse exercício, aliás, companheiro e eu temos nossas constantes: falamos mal de um dos condomínios (evidentemente, não falarei qual é, pois já tive a minha cota de polêmica semanal), que é mal-acabado, desestruturado, imenso pombal, e elogiamos o outro, que é lindo, de estruturas firmes e de vista maravilhosa.

À medida que avanço, passo pela “matinha”, que fica ao lado da pista que atravessa o Parque. É ali que costumo observar melhor as pessoas. A fauna é interessante: pequenos, altos. Gordos, magros. Bem-vestidos, largados. Crianças e patins. Skates e cães, muitos cães. Uns dizem boa tarde e levo um sustinho. Outros ouvem música. Alguns simplesmente retribuem o olhar e eu então desvio os olhos e paro pra tomar uma água no bebedouro. Em algumas situações, aliás, já travei conversas breves à beira do bebedouro, conversas que giram em torno dos nossos filhos (lindos) e de nossos cachorros (fofos).

Continuo a caminhada. Se estou com meus pais, fazemos uma paradinha também no banheiro, que sempre acho muito limpinho e me sinto num lugar civilizado e que bom que a manutenção é tão caprichosa.

Depois, chega a apoteose do passeio, pelo menos sob a perspectiva da filha: o laguinho e seus patinhos e gansos e tartaruga (há também um rato não-fofo e muito selvagem e real, que mora na árvore ao lado de um dos bancos – cuidado, portanto, pessoal.). Este também é um lugar interessante para começar conversas aleatórias, soltas, sem compromisso como já existem no mundo das nossas providências e dos nossos negócios complicados.

Atravessamos a pontezinha e então, já que quase sempre a volta é a curtinha, pois o bebê é álibi perfeito e precisa comer e trocar fralda com horário marcado, começo a subida. Dia desses, havia mil minhocas mortas no asfalto. Dó delas, mas o carrinho passa em cima. Desvio das bicicletas que descem à toda e continuo a subir, bufando de sedentarismo, mas  já adrenalinizada e cheia de projetos bem-intencionados, que não se cumprirão (“hoje vou  fazer a volta interrompida, mas amanhã juro que volto e faço inteira).

Atravesso a portinhola e volto à vida @emaguasclaras como ela é: ai, que preguiça de arrastar o carrinho por essas (não) calçadas...

sexta-feira, 18 de julho de 2014

Hospital e escola: AQUI SIM!




Chegou-me aos ouvidos a história de uma moradora de Águas Claras que pegou um táxi e soltou o verbo com o taxista. Segundo ela, não temos escola e hospital público @emaguasclaras porque há ASSOCIAÇÕES e GRUPOS DE MORADORES que se articulam politicamente e impedem isso. Os motivos, enfeixados neste ou naquele argumento furado, têm a ver basicamente com aquilo que a senhora resumiu (elegantemente, aliás) da seguinte maneira: “e esse pessoal por acaso quer pobre de Ceilândia e Samambaia vindo de metrô pra cá, para utilizar escola e hospital? De jeito nenhum!”.

Fiquei tão indignada que até resolvi ressuscitar o blog. Se isso for mesmo verdade (e eu acho mesmo muito provável), acaba por aqui todo o meu gosto por ser moradora da cidade. Quando brinco que somos classe mediazinha, falo isso com carinho, expressando a realidade de quem trabalha, paga conta e se esforça pra ter uma vida digna e minimamente confortável, mas impedir que a cidade desfrute de aparelhos públicos básicos é a coisa mais mesquinha e tacanha que já vi, a coisa mais mediamediocrezinha da face da Terra.

Tenho muita consciência de que não somos sós, de que precisamos do Estado, de que, apesar de nossos condomínios bem-arrumados, de nossas áreas de lazer maravilhosas, continuamos a precisar, para nós e para as pessoas que amamos, de apoio público. Ignorar que um dia qualquer um de nós pode necessitar do aparato estatal é até imaturidade. Vou dar um exemplo bem simples: minha filha toma, por indicação da pediatra, algumas vacinas no Sabin. Outras, a menininha toma no posto de saúde e, querem saber? Prefiro o Posto! Vou àquele da Praça do DI, em Taguatinga, e sempre fui muito bem-tratada. Talvez por darem mais picadas que as colegas do laboratório particular, as servidoras do Posto são muito mais eficazes, mais precisas no serviço. Além disso, uma das vacinas que ela toma gratuitamente, por ser prematura, é a palivimzumabe (acho que é este o nome), uma vacinazinha assim de uns 5 mil reais  A DOSE, sendo que ela tomou 3 doses no ano passado e 3 neste ano.

Qual é o morador da nossa cidade que pode bancar umas doses dessas? Desconheço.

A atitude de quem recusa hospital na cidade, para não atrair pessoas “diferenciadas”, é essa sim é de uma pobreza sem fim. Desconhecer que estamos todos interligados, que o buraco na pista nos diz respeito, pois podemos nos machucar nele, que o hospital público ao lado da nossa casa pode ser o que vai nos salvar a vida (ou nos pagar um tratamento de câncer, não bancado por nossos super planos de saúde, que nos faltam nas horas mais necessárias), que a escola pública pode fazer a vida de empregadas domésticas, porteiros e funcionários em geral mais fácil, e que isso é excelente, mesmo se consideramos só nossa perspectiva egoísta, pois pode refletir na prestação de serviços melhores, é ser mesmo muito imaturo, é conhecer pouco da vida e das fragilidades humanas.

Enfim, como não sei se se trata mesmo de uma verdade, paro por aqui, mas fica um último recado: queridos, se fôssemos mesmo RICOS, que não precisam conviver nem entrar em contato com pobres, estaríamos morando no Plano Piloto. Ou melhor, estaríamos no Lago Sul. Ou em Miami. Ou em Dubai.

Não aqui @emaguasclaras.

 Não aqui.